
A tragédia a que
assistimos esta semana, e que teve como cenário o Rio de Janeiro, nos comoveu
por dois motivos: pelos dramas das famílias e pelo fato de que já era
anunciada. Apenas 24 horas de chuva foi o suficiente para instaurar um quadro
caótico na Cidade Maravilhosa. Ventos de mais de 110 quilômetros por hora
provocaram 170 quedas de árvores, número oficial fornecido pelas autoridades,
além da destruição de casas, veículos e perdas de vidas humanas. A ciclovia Tim
Maia não resistiu e desabou pela terceira vez.
Apesar de me referir à
tragédia na capital carioca, as demais regiões brasileiras enfrentam dramas
parecidos decorrentes das chuvas torrenciais, como Teresina, no Piauí; e
Imperatriz, no Maranhão, só para citar cidades mais próximas. O resultado são
famílias desabrigadas e prejuízos incalculáveis, que abrangem perdas
financeiras e emocionais, cujo único ponto positivo é a solidariedade, pois
irmana pessoas diferentes.
A natureza tem mudado. As
águas de março que fechavam o verão, trazendo promessa de vida nos versos de
Tom Jobim ficaram para trás. Mas o triste é constatar que a humanidade ainda
não mudou. Insiste em fazer as coisas do mesmo jeito, esperando resultados
diferentes. O quarto relatório do Painel Científico Internacional sobre as
Mudanças Climáticas (“IPCC”, na sigla em inglês), publicado em 2007, constatou
um aquecimento de 0,7 a 1ºC na temperatura do planeta. Como consequência, dizem
os estudiosos, o aumento das chuvas, enchentes, secas e furacões. No Brasil, a
Organização Não Governamental WWF registrou que haverá redução dos recursos
hídricos nos próximos anos, extinção de algumas espécies e no caso do Sudeste,
principalmente nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo, haverá grandes
inundações.
Esse novo tempo que
atravessamos requer imediatas ações de adaptação às mudanças climáticas que já
estão em processo acelerado, sob o risco de as tragédias se repetirem.
Independente da questão climática com qual teremos que lidar, pois o verão
sempre virá com suas águas. E é grave saber que a falta de políticas de
saneamento, a correta ordenação da ocupação do espaço urbano, a pura desídia
dos administradores públicos, que se sucedem, é que mantêm as condições
propícias para os desastres recorrentes.
Em todo o país,
assiste-se, ano após ano, década após década, o mesmo enredo agravado pelo
aumento exponencial da população e o nascimento de bairros sem qualquer
estrutura física ou de mobiliário urbano, menos ainda pavimentação adequada,
com os agravantes da rede de esgotamento sanitário e pluvial precária ou
inexistentes e o aumento paulatino da impermeabilização do solo, principalmente
nas metrópoles. Resultado: populações de baixa renda expostas a situações de
precariedade de qualidade de vida e suporte de saúde insuficiente.
Chuvas são previsíveis,
ainda aquelas que, por situações pontuais, como as do presente momento, têm seu
volume substancialmente aumentado. Mas planejamento e execução de estruturas no
espaço urbano capazes de lidar com estas situações são, igualmente, passíveis
de serem antecipados.
Em fevereiro deste ano, na
Bélgica, mais de 35 mil jovens lotaram as ruas com cartazes e protestos pedindo
a atenção das autoridades para as mudanças ambientais que o planeta atravessa,
num movimento denominado Climate Change Strike ( Greve pelas Mudanças
Climáticas) e foram seguidos por estudantes da Suíça, Alemanha e Austrália. Um
exemplo louvável vindo de um continente de estágio avançado de respeito aos
direitos humanos. A história mostra que os dramas tendem a se repetir, quando
ignorados ou não evitados. Espera-se que os novos dias chuvosos na próxima estação
não venham acompanhados de relatos de dor e sofrimento, estes passíveis de
serem previstos e evitados.
Por Natalino Salgado Filho
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